NUNO CARINHAS

COISAS FIXAS

Respondendo à letra à construção de um "Livro de Cabeceira" (Pillow Book), tornamo-nos paparazzi de nós mesmos. O olhar acorda, ainda desfocado, para a captação do que nos está mais próximo: fragmentos de espaços, objetos e corpos; dentro e fora do casulo; texturas e luzes que não são das mesmas cores à vista desarmada. Relances diarísticos dos nossos "Dias Felizes". Entram pelo ecrã imagens de linchamentos à queima-roupa, guerras fratricidas na Europa (a esfarelar-se, a arder e arrastada pela enxurrada), mais denúncias e rasteiras de bairro.

E continuamos a disparar a máquina, mais ou menos ancorados às coisas que aparentemente mantemos em ordem — para não tropeçarmos ao acordar. Adquirimos, colecionamos e dispomos; desfazemo-nos do que já não podemos manter; adquirimos outras coisas, num frenesi sistemático de consumo, mesmo que frugal (o que não cabe nos arrumos segue para os aterros). 25 instantâneos imperfeitos são os esboços de várias narrativas. O que há de interessante nesta máquina de captação é a imprevisibilidade e a distorção, como nos sonhos, que não se podem retocar.

 

Nuno Carinhas